As Permanências da Servidão e das Relações de Poder no Brasil
As duas imagens analisadas retratam com nitidez o Brasil colonial e imperial, onde a lógica da escravidão estruturava as relações econômicas, sociais e de poder. De um lado, vemos a ostentação das elites, transportadas em liteiras ou redes, sustentadas pelo trabalho de pessoas negras escravizadas, vestidas com trajes que tentavam mascarar a condição de submissão e exploração extrema, imposta pelo sistema escravocrata. No entanto, trata-se da face cruel de um sistema que desumanizava e explorava.
Se observarmos com atenção, essa estrutura de exploração não se rompeu por completo com a Independência do Brasil, em 1822, nem mesmo com o fim legal da escravidão em 1888. O que se vê, na verdade, é uma reorganização do poder, onde as elites econômicas e políticas continuaram reproduzindo mecanismos de dominação, agora sob formas que, muitas vezes, são naturalizadas pela sociedade.
Um exemplo emblemático dessa permanência é o papel dos cordeiros no Carnaval de Salvador. Os cordeiros, majoritariamente pessoas negras e periféricas, são aqueles que seguram as cordas dos blocos, delimitando o espaço de circulação para que a classe média e a elite curtam a festa, protegidas e isoladas da multidão. É simbólico — e profundamente perverso — que aqueles que são herdeiros culturais diretos dos criadores do Carnaval (expressão genuinamente negra) estejam relegados à função de manutenção da ordem e de “proteção” para quem pode pagar por esse privilégio.
Assim como no período da Conjuração Mineira, onde a luta pela liberdade se limitava, em muitos casos, aos interesses das elites locais (mineradores, comerciantes e senhores de terras que desejavam autonomia econômica, mas não necessariamente o fim da escravidão), na Independência do Brasil, o rompimento com Portugal também não significou liberdade plena para todos. Foi uma independência feita de cima para baixo, preservando as bases sociais escravocratas e racistas.
Portanto, há sim mudanças de forma, mas permanências de conteúdo. A exploração, a desigualdade e o racismo estrutural que fundamentaram o Brasil colônia seguem vivos, agora travestidos em relações de trabalho precarizadas, informalidade e na exclusão social que marca os espaços urbanos e culturais.
Reflexão Final
A análise das imagens e da realidade atual nos convida a refletir: até que ponto, como sociedade, rompemos realmente com as estruturas coloniais? A resposta parece apontar que seguimos, muitas vezes, apenas adaptando as antigas formas de opressão, mantendo os mesmos sujeitos na base da pirâmide social.